MUSEU FERREIRA DE CASTRO
Rua Consiglieri Pedroso, 34 • 2710-550 Sintra
Telefones: 21 923 8828 / 8412 • Fax: 21 923 8522
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Terça-feira a sexta-feira: 10h às 18h
Sábados, domingos e feriados: 12h às 18h
Encerra à segunda-feira.
A entrada é gratuita.
INFÂNCIA (1898-1911)
«O homem ama na terra natal os seus hábitos, se ali reside ou residiu muito tempo; ama a sua casa e o seu agro, se os tem; e ama, sobretudo, a sua infância, que lhe comandará a vida inteira e se amalgama com o drama biológico do envelhecimento e da morte. Ama esse período da sua existência por saber que jamais voltará a vivê-lo; e essa certeza de irrecuperabilidade embeleza-lhe o cenário nativo e valoriza-lhe os anos infantis, mesmo se neles conheceu a miséria, os trabalhos prematuros, as opressões e as humilhações impostas pelos adultos.»
FERREIRA DE CASTRO, «A aldeia nativa» (1969), Os Fragmentos [1974]
Este primeiro grupo refere-se à meninice do romancista, na «aldeia nativa» de Salgueiros, freguesia de Ossela, concelho de Oliveira de Azeméis, onde nasceu, em 24 de Maio de 1898. Deste período ficarão as marcas de um íntimo contacto com a verdejante natureza envolvente. Órfão de pai aos oito anos, a sua infância seria igual à de tantas outras crianças – escola com o professor Portela, catequese com o padre Carmo –, não fosse a decisão inusitada de emigrar para o Brasil, com 12 anos incompletos. Em 7 de Janeiro de 1911 Ferreira de Castro embarcou no vapor Jerôme. Saiu criança, regressaria já homem.
NO BRASIL – DA SELVA AMAZÓNICA A BELÉM DO PARÁ (1911-1919)
Devo-lhes [aos brasileiros] muito. Com eles aprendi a amar a humanidade.»
FERREIRA DE CASTRO, entrevista ao Diário Popular (1966)
Relata a época em que Ferreira de Castro viveu no seringal ironicamente chamado «Paraíso», na Amazónia, onde escreveu o primeiro romance, Criminoso por Ambição, vivência que mais tarde se repercutiria em A Selva.
Embora trabalhasse como caixeiro num armazém, marcou-o fortemente a convivência com os seringueiros cearenses e paraenses, vítimas da adversidade do meio e da exploração praticada pelos proprietários das plantações. Deixou o seringal em Outubro de 1914, tendo passado por enormes dificuldades. Nos intervalos de expedientes como a colagem de cartazes ou o trabalho num navio que fazia a cabotagem do Oiapoque, lia avidamente os clássicos, na Biblioteca Pública de Belém.
A partir de 1915 dedicou-se ao jornalismo, tornando-se mais tarde profissional, publicando no ano seguinte os seus primeiros livros, Criminoso por Ambição e Alma Lusitana.
O REGRESSO - Jornalismo e obras da primeira fase (1919-1928)
«Parente muito próximo da literatura e com momentos exultantes, o jornalismo representava para mim o forno de onde me vinha o pão e assim poder realizar os meus pobres livros à sua ilharga, nas horas destinadas ao repouso, que eu utilizava vencendo todos os cansaços. Era ele que me punha a mesa sóbria, me substituía os fatos e os sapatos quando muito usados, me pagava os cigarros e os cafés. Sem ele, cuja conquista já me fora tão penosa, eu não podia entregar-me, naqueles dias, ao meu teimoso sonho de romancista, que se desdobrava imenso entre imensos escolhos.»
FERREIRA DE CASTRO, «Origem de «O Intervalo» (1972), Os Fragmentos [1974]
Esta secção mostra parte da actividade jornalística de Ferreira de Castro e as obras da primeira fase, não reeditadas. Regressado em 1919, Castro, sem conhecimentos no meio, envereda de novo penosamente pelo jornalismo.
Free-lancer, até 1927, ano em que entra para O Século, colaborou em inúmeras publicações, com destaque o diário A Batalha e a revista ABC. Tendo no início da década dirigido publicações efémeras – O Luso (1920) e A Hora (1921) –, fundou e co-dirigiu em 1928 a Civilização, de colaboração ecléctica e excelente qualidade gráfica. Ao mesmo tempo ia publicando os seus primeiros livros, que hoje são raridades bibliográficas, num total de treze títulos: do Mas... (1921) a O Voo nas Trevas (1927).
O TRIUNFO – De Emigrantes à direcção de O Diabo (1928-1935)
«Eu devia este livro a essa majestade verde, soberba e enigmática, que é a selva amazónica, pelo muito que nela sofri durante os primeiros anos da minha adolescência e pela coragem que me deu para o resto da minha vida.»
FERREIRA DE CASTRO, A Selva (1930)
1928 é o ano de Emigrantes, obra que abriu novos horizontes ao romance português, assumindo-se o autor como «biógrafo das personagens que não têm lugar no mundo.» Sucede-lhe A Selva (1930). Livro poderoso, em que a personagem principal é «o inferno verde», traduzido rapidamente para várias línguas, tornou Ferreira de Castro o escritor português mais conhecido além-fronteiras. Seguem-se-lhe Eternidade (1933) e Terra Fria (1934), Prémio Ricardo Malheiros da Academia das Ciências. Esta secção contempla assim o pequeno lapso de tempo que permitiu a Castro, então na casa dos 30 anos, afirmar-se como uma das certezas do romance nacional.
O ÚLTIMO VAGAMUNDO (1929-1939)
«[...] a verdade é que, por cima da minha condição de europeu, de latino e de português, sinto na minha alma uma grande identidade com a alma de todos os outros povos. Creio, aliás, que isso acontece com quase todos os homens, mesmo sem eles darem por isso, mesmo sem eles o saberem...»
FERREIRA DE CASTRO, carta particular (1953)
Como autor de literatura de viagens, Ferreira de Castro faz parte duma linhagem com tradição nas letras portuguesas. Pequenos Mundos e Velhas Civilizações (1937), escrito com base numa viagem pelo Mediterrâneo, em 1935, a que se juntaram notas de uma visita a Andorra (1929) e outra à Irlanda (1930), deveu-se à simpatia de Castro «por todos os que vivem isolados no planeta» e também à conjuntura política interna, que lhe não permitiu ou, inclusive, censurou livros que tinha em mãos. Pela mesma razão, realizou uma volta ao mundo, em 1939, com a pintora Elena Muriel, sua mulher, viagem que testemunha essa mesma fraternidade à escala planetária e documenta uma realidade geo-política que seria profundamente alterada no pós-guerra. O visitante poderá observar alguns desenhos originais, resultado desse périplo.
O MESTRE – DE A TEMPESTADE A OS FRAGMENTOS (1940-1974)
«Nele, mais do que em qualquer outro romancista de língua portuguesa de nosso tempo, há um gosto de mundo. E a presença intemporal do homem aparece, dura, sob a densa camada de temporalidade que o ficcionista constrói. O que o torna um mestre de invenção e de feitura. E dono de uma execução ficcional tão perfeitamente adequada às realidades que nos faz encontrar, na sua ficção, a verdade do tempo.»
ANTÔNIO OLINTO (1966)
Este núcleo contempla o período em que Ferreira de Castro pontificou como autor proeminente do Portugal de então. Com Aquilino Ribeiro, personificou a figura do Escritor com todo o peso intelectual, moral e cívico, de que não deixou de fazer uso quando a situação política e social assim o exigiu. São os anos de A Tempestade (1940), A Lã e a Neve (1947), A Curva da Estrada (1950), A Missão (1954), O Instinto Supremo (1968) e Os Fragmentos (1974). É também o período de As Maravilhas Artísticas do Mundo (1959-1963), longo ensaio premiado pela Academia de Belas-Artes de Paris, cujo subtítulo, A Prodigiosa Aventura do Homem através da Arte, reflecte as suas inquietações e anseios.
UM ESCRITOR À CONQUISTA DO MUNDO
«O génio de Ferreira de Castro está em ter sabido descrever, com um poder incomparável, não apenas a condição portuguesa ou brasileira, mas toda a condição humana.»
ROBERT BRÉCHON (1966)
A última sala do Museu Ferreira de Castro mostra espécimes relacionados com a internacionalização da obra do escritor, que continua hoje a merecer a atenção não apenas dos leitores portugueses, como de editores estrangeiros. Em resumo, o visitante tomará contacto com edições raras, manuscritos, objectos pessoais, ilustrações originais para os seus livros e outros objectos relacionados com a vida e a escrita do romancista. O Museu apresenta também telas e desenhos originais de Arlindo Vicente, Bernardo Marques, Cândido Portinari, Elena Muriel, Jorge Barradas, Júlio Pomar, Roberto Nobre e Stuart Carvalhais, entre outros.
O GABINETE DE TRABALHO
O escritório de Ferreira de Castro foi reconstituído de acordo com a disposição que tinha na sua casa de Lisboa. Pode ver-se a secretária do escritor, sobre a qual estão diversos objectos pessoais, decorativos e de escrita, bem como quadros, com destaque para retratos seus da autoria de Eduardo Malta, Roberto Nobre e Stuart, além de fotografia de alguns amigos. Da biblioteca pessoal constam livros dedicados de autores contemporâneos como Raul Brandão, Aquilino Ribeiro, Egas Moniz, Gago Coutinho, Fidelino de Figueiredo, Hernâni Cidade, José Régio, José Rodrigues Miguéis, Alves Redol, Fernando Namora, Carlos de Oliveira, José Cardoso Pires, Jorge Amado, Graciliano Ramos, Valle-Inclán, Louis Aragon, Somerset Maugham, entre muitos outros.
O ESPÓLIO
O riquíssimo espólio documental, composto por mais de vinte mil documentos de correspondência, largas dezenas de títulos de periódicos, manuscritos e inúmeros documentos diversos, está aberto aos investigadores, doutorandos, mestrandos e estudantes universitários.
Da correspondência de escritores, artistas plásticos, cientistas, políticos e editores, constam nomes tão diversos quanto os de Eugénio de Andrade, João Lúcio de Azevedo, João de Barros, Agustina Bessa Luís, António Botto, Jaime Brasil, Alexandre Cabral, Joaquim de Carvalho, Augusto Casimiro, Fernanda de Castro, Natália Correia, Jaime Cortesão, Júlio Dantas, Mário Dionísio, Sant`Ana Dionísio, Assis Esperança, Vergílio Ferreira, M. Rodrigues Lapa., Ruben A., Óscar Lopes, Ilse Losa, Vitorino Nemésio, Joaquim Paço d`Arcos, João Sarmento Pimentel, Raul Proença, Álvaro Salema, António Sérgio, Alberto de Serpa e Erico Veríssimo, entre muitos outros.